quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Paula Figueiredo - Comentário ao debate de Fernando Hernandez

Debate/palestra de Fernando Hernandez, 13 de Dezembro de 2011, 15 horas


Num encontro quase perfeito entre audiência e Fernando Hernández importa referir, em traços gerais, as questões pertinentes, as sábias experiências de trabalho e o diálogo feliz que se travou na sessão de debate. Perante a ausência de identidade dos intervenientes (também pertinente por provar a permeabilidade dos temas sentida pela maioria dos presentes) gerou-se um ambiente de cruzamento de relatos donde emergiram temas cruciais ao questionamento da mediação cultural.
Da palestra proferida no período da manhã por Fernando Hernández ficou a figura do CRIADOR DE CIRCUNSTÂNCIAS, que conduz subtilmente o outro a encontrar a sua própria criatividade. Sem que seja impositivo, esta figura transgride os cânones académicos, deixando de ser um transmissor de conhecimentos, que fala e parece gostar de se ouvir, para ser o educador – aquele que conduz o outro no seu próprio caminho da descoberta criativa. Será esta a chave para mudar a escola?[1] – Ainda sem resposta, o orador mostrou o ENCONTRO num compromisso de dois indivíduos, no qual algo acontece de importante, repercutindo-se na estrutura do indivíduo que é conduzido pelo CRIADOR DE CIRCUNSTÂNCIAS. O ENCONTRO é o ponto nevrálgico da pesquisa entre alunos e professor.
O relato de uma experiência revela um projeto desenvolvido pelo orador e os seus alunos de Belas Artes, no qual o tema de pesquisa foi simplesmente a ausência, ou seja o silêncio, provocado por um questionamento do professor aos alunos sobre o que haveriam de pesquisar. Indo ao encontro da curiosidade dos seus alunos, conseguiu motivá-los e envolvê-los num projeto criativo multifacetado.
Deste modo, Fernando Hernández apresentou três modos de pesquisa:
1.     Pesquisa Criativa.
2.     Pesquisa Artística.
3.     Pesquisa Social e Humana (mais tarde dirá ser a fundamental das artes, a que permite ver o que a científica não permite).
Do questionamento sobre a pesquisa surgem também modos de relação do artista com a escola. No primeiro, o artista necessita da escola para construir o seu projeto, no segundo o projeto constrói-se na escola, no terceiro a escola quer desenvolver um projeto com a colaboração de um artista numa perda de autoria artística, rara de se ver. Por fim, o artista e a escola podem juntos desenvolver o projeto.

O museu pode ser o lugar para fazer projetos. E esse lugar é o ponto de ENCONTRO. Das escolas fica uma discussão em aberto sobre se serão ou não comunidades. Umas são, outras não. Quando há uma hierarquia perdem-se as responsabilidades partilhadas, que para o orador devem existir numa comunidade. Mas o que é uma comunidade? – Se questionássemos as escolas não chegaríamos a um consenso.

Perante a troca de algumas experiências de uma audiência bem conhecedora da realidade escolar (ou comunidade escolar também ponto de questionamento), o orador refere as muitas brechas deixadas pelo sistema político que nos dão oportunidades criativas de trabalhos numa resposta à falta de recurso e falta de condições de trabalho.
E, se em Barcelona há artistas que fazem projetos na escola, há também uma falha na prática formativa dos mesmos.
Fica então a noção de que a arte é um conjunto de RELATOS, dando o exemplo de Miró, que muito mudou o seu modo de relatar. Para o RELATO da cultura a biografia é essencial: como os indivíduos relacionam o seu relato com a sua biografia.

Nos museus o que se oferece é a informação: “E o que tem a ver a informação comigo?” – diz Fernando Hernández. Nem no museu nem na escola há reflexão, só informação.
Em Portugal, é referido por alguém da audiência, que existem comunidades em algumas escolas, muito pelo trabalho individualizado de alguns professores e nos museus, acrescentou outra pessoa[2]  que também há uma clara mudança nos Serviços Educativos, na qual se convoca as oportunidades de ENCONTRO, num breve momento que pode durar só uma hora, mas que provoca uma mudança importante, referindo o facto de ter uma equipa de CRIADORES DE CIRCUNSTÂNCIA.
Daqui também surge a palavra como armadilha, como algo no qual  estamos enredados  - “não há melhor prática que uma boa teoria”, como salienta o orador.

Por fim, refira-se a imaginação pedagógica (o anjo perdido!), agora ausente das escolas. Para Fernando Hernández, o melhor material didático é o que se constrói com as crianças, não são os manuais escolares. Devemos ativar a imaginação pedagógica, não podemos viver sem utopia.
Quanto aos adultos, não têm tempo nem paciência, ao contrário dos idosos que facilmente partilham as suas histórias de vida, tal como refere num exemplo passado na Catalunha, no qual um grupo de idosos se predispôs a filmar os seus relatos. Da Austrália refere um Centro sem acervo que todos os anos faz uma exposição sobre a história de vida dos habitantes e que assim consegue reunir um grande arquivo de histórias de vida.

Do debate saem reforçadas as ideias anteriormente apresentadas na palestra, assentes no indivíduo participativo com o seu RELATO num diálogo analítico e criativo, que problematiza e que questiona o que no ENCONTRO com o outro emerge, numa mudança constitutiva do seu modo de relatar.

Fernando Hernández deixou-nos também três interrogações (apresentadas como pano de fundo ao debate):
·      Como podemos contribuir para que o museu seja um espaço performativo?
·      Como fazer com que as exposições possibilitem estados de encontro?
·      Como possibilitar e estar atento às “rotas” de leitura dos visualizadores emancipadores?

Em tom de conclusão não conclusiva ficamos com estes questionamentos num trabalho com o público cada vez mais exigente.

Paula Figueiredo



[1] A pergunta veio de Porto Alegre, Brasil.
[2] Susana Gomes da Silva, CAM/FCG.
 

1 comentário:

  1. Obrigada Paula! Que texto tão bom. Foi excelente que tenhas retirado as ultimas perguntas que o F. Hernández deixou no ar. São mesmo muito provocadoras, não são?

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