quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Margarida Melo - Comentário à palestra de Fernando Hernandez


“Transitar entre el museo existente y el museo (im)posible en tiempos de espectadores emancipados.” – Fernando Hernández

Através da apresentação de alguns projectos educativos de colaboração entre escolas e museus, nos quais esteve envolvido nos últimos anos, Fernando Hernández convidou-nos a (re)visitar algumas ideias-chave que fundamentam a sua abordagem pedagógica.

Desde logo enunciados no título da sua palestra, surgem dois conceitos que lhe interessou prontamente clarificar. A ideia de ‘museu (im)possível’, enquanto espaço de possibilidade para práticas museais de ‘encontro’; práticas que abram caminho a novas e diferentes narrativas, que espelhem essas circunstâncias de diálogo(s). Bem como, a ideia de ‘espectadores emancipados’, espectadores portadores de saberes e experiências que não podem ficar à porta do museu.

Num primeiro momento da sua palestra, Hernández apresentou-nos o pensamento de vários autores que têm contribuído para a sua reflexão em torno das práticas educativas e posturas pedagógicas, nas escolas e também nos museus. Entre eles, destaco a ideia, de Maite Laurrari, de arte enquanto expressão de relações. Enquanto criação de linguagens que nos permitem a construção do ‘encontro’.

Papel essencial na construção desse encontro museal, está reservado aos educadores/mediadores, cujo principal desafio é aquilo a que Hernández chama de ‘criação de circunstâncias’. Na explicitação desta genial ideia de educador-criador-de-circunstâncias, Hernández socorre-se da análise Freiriana da concepção ‘bancária da educação’, na qual o ‘educador aparece como seu indiscutível agente, como seu real sujeito, cuja tarefa indeclinável é “encher” os educandos dos conteúdos de sua narração.’ (Freire, 2005: 65)

Assim, ao diálogo comunicativo, de transmissão aditiva, há que preferir o diálogo analítico, aquele que atende aos caminhos de leitura dos que participam de uma conversa cultural. Diálogo que resulte (e simultaneamente decorra) numa narração não fragmentada, não linear e contextualizada.

Aliás, Hernández questiona-se se a expressão ‘mediadores culturais’ não traz, em si, uma ideia colonizadora e hegemónica, contrária à visão, também ela Freiriana, de emancipação dos públicos. Será o mediador cultural o ‘educador que opta e prescreve a sua opção’, enquanto os públicos se limitam a ser ‘os educandos, os que seguem a prescrição’ (Freire, 2005: 68)? Ou, só o é se for esse o paradigma pedagógico em que opera?

No entanto, na minha opinião, a noção de ‘espectadores emancipados’, careceu de um debate mais alargado e crítico. Serão as crianças, alvo preferencial dos projectos de trabalho propostos por Hernández, espectadores verdadeiramente emancipados? Acredito que a metodologia que Fernando Hernández nos propõe poderá contribuir, substancialmente, para a criação de futuros públicos adultos emancipados. Mas, como criar projectos de trabalho pedagógicos, verdadeiramente transformativos, dirigidos aos adultos de hoje? Aos tais que não têm tempo?

Termino com uma das frases de Fernando Hernández que mais ressoou em mim: ‘se um encontro não nos ensina nada sobre nós próprios, então, é um encontro perdido’. Este não foi seguramente um encontro perdido.

Por Margarida Melo


Freire, Paulo (1968/2005), Pedagogia do Oprimido, Paz e Terra: São Paulo: 65
Larrauri, Maite (2000), El deseo según Deleuze, Editorial Tándem

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